Por Que Não Existe Cachecol da Sorte

Laboratório do Ser - Edição #012

“Milagres em si não importam. A única coisa que importa é a sua Fonte, que está muito além de qualquer avaliação. Milagres ocorrem naturalmente, como expressões de amor. Nesse sentido, tudo que vem do amor é um milagre. Milagres são hábitos e devem ser involuntários”

Um Curso em Milagres

Imagem produzida com Inteligência Artificial… fiquei gata!! Saudades dos 20 anos 😂

Negócio da China em Manhattan (graças ao meu cachecol da sorte?)

Era uma tarde congelante em Manhattan, mas, como era de costume no inverno, o céu estava azul e sem nenhuma nuvem. A cidade pulsava, mas meu coração estava apertado, pois meus pais partiam para o Canadá, deixando-me pela primeira vez sozinha em um país estrangeiro. Eu tinha 23 anos, trabalhava em Wall Street e ainda tinha o privilégio de morar na casa deles.

Sem muito ânimo, comecei a buscar um apartamento para alugar. Apesar de ter um salário acima da média para uma jovem de 23 anos, os aluguéis de apartamentos com quarto e sala eram exorbitantes. Eu ia ter que me contentar com uma quitinete.

Alugar era a opção mais realista, mas acontece que sou sonhadora.

Navegando em sites como o Craig's List, me deparei com quitinetes à venda, todas na faixa dos US$120 mil ou mais, um preço que estava totalmente fora do meu alcance.

Com uns trocados do meu bônus anual no BNP Paribas, cerca de US$20 mil, decidi arriscar e visitei alguns desses apartamentos. A maioria pedia uma entrada de 30%, uma grana que eu não tinha na conta. Até que, num desses dias gelados, apareceu um anúncio de "open house" para uma quitinete no Upper West Side (na 72 entre Columbus e Amsterdam).

O anúncio dizia "railroad studio", indicando uma separação sutil entre quarto e sala/cozinha. Como era um open house, não precisei agendar horário. Peguei minha chave, meus óculos de sol, casaco, luvas, gorro e saí de casa com minhas expectativas tão quentes quanto a temperatura lá fora. Mas o frio estava de lascar e agarrei meu cachecol preferido - um cachecol listrado - antes de enfrentar novamente o frio nova-iorquino.

O studio era tipo um oásis de luz, no oitavo andar, com um janelão que fazia o sol brilhar aquecendo o dia frio. Quem já morou em Manhattan sabe que isso é uma raridade porque a maioria dos apartamentos são escuros e úmidos e se parecem mais com cavernas. Acredita que vários amigos meus tinham apartamentos em porões onde sequer batia sol?

Bom, voltando ao nosso herói aqui, o apartamento. Tava mais ou menos, sabe? Um tapete velhinho pedindo arrego, cheio de manchas suspeitas, e o banheiro merecendo uns retoques, principalmente na banheira, que tava meio "vintage" demais, se é que me entende.

Apesar de estar mal cuidado, o sol batia no meu rosto e eu enxerguei além daquilo que meus olhos viam.

Tinha muito potencial.

Puxei assunto com o dono, que era muito simpático. Quem me acompanha há mais tempo sabe que eu gosto de falar, então engatamos num papo agradável.

A certa altura ele solta a seguinte frase:

“Olha, estou passando por uns apertos financeiros na minha empresa. Meu real desejo era vender esse lugar. Anunciei para aluguel, mas se eu conseguisse vender eu realizaria meu sonho de quitar todas as minhas dívidas.”

Foi a isca perfeita para essa ariana impulsiva que vos fala.

Perguntei, com muita segurança, como se eu fosse a própria princesinha rica de Wall Street e minha conta bancária tivesse muito mais que US$20 mil.

"Por quanto você quer vender?”

“Estou meio por fora dos preços. Acho que uns US$80 mil.”

Estava bem abaixo do mercado. Eu, que não tinha visto nada decente por menos de US$120 mil, fiz as contas na cabeça e pensei, "eu consigo dar entrada nisso".

Gritei como se eu tivesse acabado de ganhar no BINGO:

“Fechado!”

Ele me olhou meio incrédulo.

“Não mostre para mais ninguém. Encerre o open house. Onde eu assino que me comprometo a comprar por esse valor?"

Arrumamos um papel de pão (ou melhor, de bread 😂) e assinamos ali mesmo. Ele encerrou o open house e ligamos para o banco para redigir o contrato de compra e venda.

Dessa forma, tornei-me proprietária de um apartamento em Manhattan por US$80 mil, com apenas US$20 mil no bolso.

Anos depois, deixei Wall Street, retornei ao Brasil e vendi o imóvel por US$320 mil, praticamente o triplo do preço. Uma negociação que me fez questionar: foi sorte de principiante ou o poder do meu cachecol listrado?

Cheguei à conclusão que só podia ter sido por causa do cachecol e, por mais irracional que seja, por muito tempo eu o carreguei para todos os meus eventos importantes. É sobre essa associação maluca que quero falar nesta Newsletter.

Falso conhecimento: o perigo do viés de associação

Nosso cérebro é uma máquina de fazer associações e é até bom que seja assim.

Se comemos uma fruta desconhecida e passamos mal, no futuro evitamos a fruta e classificamos a fruta como venenosa ou, pelo menos, como não comestível. Isso garantiu, através das gerações, a sobrevivência da espécie.

No entanto, assim também surge o falso conhecimento.

Ivan Pavlov foi a primeira pessoa a estudar o que hoje chamamos de viés de associação.

Originariamente, o pesquisador russo queria apenas medir a salivação nos cães. O método experimental foi estruturado de maneira que um sino tocasse antes que a ração fosse dada aos cães.

Surpreendentemente, em pouco tempo, o simples toque do sino tornou-se o suficiente para induzir a salivação nos cães. Essa associação entre estímulos aparentemente não relacionados - o som do sino e a produção de saliva - revelou-se um exemplo clássico de condicionamento, uma descoberta que transcendeu o contexto dos cães e influenciou nossa compreensão dos padrões de associação em seres humanos.

O método pavloviano demonstrou como essas conexões podem ser poderosas e, por vezes, inconscientes, ilustrando a presença do viés de associação em nossos próprios processos mentais.

O viés de associação refere-se à tendência humana de conectar ideias ou conceitos de forma automática, muitas vezes com base em experiências passadas, estereótipos culturais ou informações preexistentes.

Esse fenômeno pode ser nocivo, pois influencia diretamente a qualidade de nossas decisões e julgamentos, levando-nos a tomar conclusões precipitadas e, muitas vezes, incorretas.

Quando associamos automaticamente determinadas características a pessoas, produtos ou situações, corremos o risco de perpetuar estereótipos prejudiciais e preconceituosos.

Marlboro Man

Além disso, o viés de associação pode distorcer a forma como percebemos o mundo ao nosso redor, limitando nossa capacidade de analisar informações de maneira imparcial e objetiva.

Por exemplo, quem lembra das propagandas de cigarro do Homem Marlboro?

Iniciada na década de 1950, a Marlboro associou seus cigarros a uma imagem de masculinidade e liberdade ao retratar cowboys robustos em ambientes rurais. A figura do cowboy, historicamente ligada à liberdade e independência, foi habilmente usada para criar uma narrativa que fumantes de Marlboro eram indivíduos fortes e destemidos.

Essa associação cria uma ligação emocional que mascara os perigos à saúde relacionados ao tabagismo e por isso a propaganda foi banida posteriormente.

Porque não existe cachecol da sorte

Existe um viés de associação particularmente espinhoso: a falsa associação a êxitos anteriores. Este viés pode levar a conclusões absurdas até mesmo nas situações mais triviais.

Aposto que você conhece alguém como o João.

É dia de um jogo crucial da seleção Brasileira. João, um fervoroso torcedor, veste sua camisa da sorte e suas meias de bolinhas verdes desgastadas. Toda vez que o Brasil venceu uma copa, João vestia esses trajes e ele se convence que existe uma associação entre as suas roupas e as vitórias do Brasil.

A crença desafia qualquer lógica, mas João se agarra à essa superstição, ignorando completamente que o sucesso da equipe do Brasil não depende das suas meias de bolinhas verdes.

Imagina se eu tivesse saído fazendo ofertas impulsivas para comprar outros apartamentos em Manhattan, confiando que seria um ótimo negócio porque eu estava usando o meu cachecol da sorte. A chance da próxima aquisição ser um desastre seria enorme.

O Cemitério dos Especialistas Falidos

O mesmo acontece no mercado digital. Durante a pandemia vimos uma série de lançamentos de produtos mal estruturados que faturaram milhões. O boom dos lançamentos levou muitos especialistas amadores e ainda inábeis à alturas nunca imaginadas. Conheço muitas pessoas que, ao invés de reinvestirem no seu negócio, torraram o dinheiro todo em viagens de luxo ou pior, se endividaram para “especular” com lançamentos ainda maiores.

Em 2021 era:

  • Muito fácil vender;

  • Existiam muitos produtos ruins e especialistas despreparados;

  • No meu nicho de desenvolvimento humano, vimos o surgimento de milhares de perfis de autoconhecimento falando a mesma coisa;

  • Um monte de posts de frases motivacionais sem nenhum repertório por trás (se eu ganhasse um real por cada post do Instagram com a frase “O Sucesso tem a face da Mãe” estaria rica).

Em 2023 o mercado passou por uma onda de profissionalização e as coisas que passaram a importar, na minha visão são:

  • Profundidade e repertório;

  • Autoralidade (ter originalidade);

  • Sucesso das alunas - porque o resultado do seu aluno importa!!!;

  • Qualidade técnica do curso - materiais complementares e aceleradores de resultados;

  • Ter um MÉTODO! Por isso ensino a desenhar o método autoral nos meus treinamentos para terapeutas.

O que aconteceu com os despreparados? Compõem o cemitério dos especialistas falidos.

Tentação e Tragédia: Napoleão e o impacto do Viés de Associação na história

Quando Napoleão decidiu lançar sua campanha militar na Rússia, ele estava firmemente enraizado no viés de associação de suas vitórias anteriores.

As gloriosas conquistas em territórios mais amenos criaram a ilusão de invencibilidade. No entanto, ao adentrar a vastidão gelada russa, a realidade se revelou cruel. O frio implacável tornou-se um adversário feroz, desafiando a narrativa vitoriosa que Napoleão tinha construído.

A crônica da campanha russa de Napoleão destaca como o viés de associação, baseado em triunfos passados, pode cegar até mesmo líderes renomados para os desafios iminentes, resultando em consequências desastrosas.

O filme do Ridley Scott - Napoleão - que foi lançado ano passado, retrata sua jornada, até ser derrotado e exilado na ilha de Santa Helena.

A obsessão por conquistar o amor de sua esposa Josephine, paralela à sua busca por vitórias em batalhas, ilustra a complexidade do viés de associação e como ele pode moldar não apenas as estratégias militares, mas também as escolhas pessoais que, por fim, levaram a sua derrota e exílio.

No filme, quando ele não consegue conquistar seu amor, ele tenta destruí-la - e destrói a si mesmo no processo.

Você já assistiu? Me conta aqui o que achou!

A partir de que momento deixa de ser sorte de principiante e passa a ser talento?

Em seu livro, A Arte de Pensar Claramente, Rolf Dobelli levanta a bola de que talvez bons resultados sejam indicação de algum talento. Mas mesmo assim, nunca é possível ter certeza, principalmente quando existem muitos figurões no jogo.

Ele diz:

  • Em primeiro lugar, se por um longo período você estiver nitidamente melhor do que os outros, o talento pode estar desempenhando alguma função nos seus resultados. Porém, nunca é possível ter certeza.

  • Em segundo lugar, quanto mais pessoas estiverem fazendo a mesma coisa, maior é a probabilidade de que alguém, por pura sorte, tenha êxito por um longo período. Talvez você seja esse alguém.

  • Caso você seja um líder em um mercado com apenas 10 concorrentes, esta certamente é uma indicação do seu talento.

    Mas, será que algumas pessoas realmente possuem mais talento do que outras? A posse de talento é, de fato, o único fator crucial para alcançar o sucesso?

A Regra das 10 mil horas

Em seu livro Outliers (Fora de Série em português), Malcom Gladwell chega à conclusão de que sorte de principiante não existe.

O sucesso é o resultado de uma dose de talento aliado a muita preparação. Por isso a importância crucial dos hábitos. Eles moldam quem vamos nos tornar. Falei sobre construção de Hábitos na Edição#005 da Newsletter.

Quanto mais os psicólogos examinam as carreiras de pessoas talentosas, menor parece ser o papel do talento inato e maior parece ser o papel da preparação.

Um estudo conduzido nos anos 90 pelo psicólogo Anders Ericsson e dois colegas na Academia de Música em Berlin revelou que precisamos investir em torno de 10 mil horas naquilo que estamos tentando fazer, para realmente ter sucesso, seja tocar um instrumento, escrever bem, ser um bom terapeuta, operar a bolsa de valores ou criar um novo aplicativo usando inteligência artificial.

O experimento criado por Ericsson consistiu em separar os violinistas da escola em 3 grupos:

  • As estrelas com potencial de se tornarem solistas renomados;

  • Os violonistas bons;

  • Os que eram medianos e provavelmente nunca tocariam profissionalmente.

Todos tinham começado a tocar violino com aproximadamente a mesma idade, por volta dos 5 anos. Nos primeiros anos, praticavam mais ou menos a mesma quantidade de horas.

Por volta dos 8 anos começaram a surgir as diferenças.

Os alunos que se tornaram estrelas começaram a praticar 6 horas por semana com 9 anos, 8 horas por semana aos 12, 16 horas por semana aos 14 e mais de 30 horas semanais aos 24 anos. Com essa idade eles tinham chegado a 10 mil horas de estudo e treino. Os bons chegaram a 8 mil horas e os medianos somente 4 mil horas.

O que chama a atenção no estudo de Ericsson é que ele e seus colegas não encontraram músicos "naturais", que alcançaram o topo sem esforço praticando apenas uma fração do tempo de seus colegas.

Não existem atalhos. Quem chega ao topo treina muito, muito mais.

Como diz o HC, meu mentor nessa área de Newsletters e Negócios:

Hábitos Fáceis, vida difícil. Hábitos difíceis, vida fácil.

Será que a regra das 10 mil horas se aplica a diferentes casos?

Os garotos de Liverpool

Os Beatles - John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr transformaram o cenário da música pop no mundo quando chegaram aos Estados Unidos em 1964.

A primeira coisa interessante sobre os Beatles é a quantidade de horas de ensaio que já tinham juntos, antes de desembarcar em Nova Iorque.

Em Hamburgo, na Alemanha, eles participavam de clubes de Rock&Roll. Nesses clubes eles tinham que tocar durante horas a fio, sem intervalos. Em uma entrevista John Lennon disse:

“Ficamos melhores e fomos ganhando confiança. Foi algo natural porque a gente passava a noite inteira tocando. Como éramos estrangeiros em Hamburgo, tínhamos que nos esforçar mais do que os garotos locais. Colocamos nosso coração e nossa alma na música. Em Liverpool só tocávamos por uma hora, nossos maiores sucessos. Em Hamburgo fomos obrigados a tocar por 8 horas seguidas."

8 horas?

Sim.

7 dias por semana.

Eles tocaram por 270 noites em um período de um ano e meio. Quando o primeiro sucesso aconteceu em 1964 eles já tinham tocado ao vivo 1200 vezes. A maioria das bandas atuais não toca 1200 noites em toda a sua carreira.

Hamburgo tornou os garotos de Liverpool uma banda fora de série.

Se você trabalha com mulheres, como eu, e sonha em liderá-las, você precisa entrar profundamente no universo da mulher que você quer transformar.

Como você quer ter resultados sem entender profundamente a psique feminina?

Como você quer gerar transformação sem entender que a maioria das mulheres tem dificuldade em vencer a síndrome da impostora porque nos ensinaram que temos que ser tudo para todos?

Como você quer crescer o seu negócio sem compreender que o perfeccionismo feminino mutila sonhos e que a maioria das mulheres fica paralisada por medo da crítica e do julgamento?

Sem um profundo repertório sobre o universo feminino, seu conteúdo permanece raso, indistinguível no mar de mensagens comuns. Nada além do mesmo discurso batido, como o clichê de que "o sucesso tem a face da mãe".

Se você deseja se destacar na multidão e estar pronta para este desafio, inscreva-se na lista de espera para a Certificação Profissional Mulheres Cíclicas, porque vamos reabrir as vagas em breve. A Certificação é o lugar onde você constrói o repertório que te falta para atingir os resultados que você deseja.

Dentro do meu 🧠

📕 (1) O que estou (re) lendo:
- Em Busca de Sentido - Viktor Frankl - Viktor era um psicólogo que foi deportado para Auschwitz, vivenciando os horrores indescritíveis de um campo de concentração. De sua experiência surgiu a impactante reflexão: “Aquele que tem um forte 'porquê' para viver, encontra a força para suportar qualquer 'como'”.

🎥 (2) O que estou assistindo:
- 15 Minutos Que Vão Transformar Sua Vida - Leandro Karnal. Só ouça!

 🎧 (3) O que estou ouvindo:
- Here Comes the Sun - Beatles

👁️ Laboratório do Ser #013 - próximo domingo 18h

Se você quiser sugerir algum tema para a próxima News do Laboratório do Ser, basta responder a este e-mail ou me enviar uma mensagem no meu Instagram @deafelicio. Sua opinião é muito importante para melhorar a Newsletter. Aguardo seu feedback.

📩 Sobre a Newsletter Laboratório do Ser

✍️ Escrita por Andrea Felicio compartilhando experiências pessoais ao redor dos temas: Mentalidade, Mulheres e Marketing.

🐝 Newsletter configurada e enviada pela incrível plataforma BeeHiiv.